Lázaro Luiz Zamenhof
LÁZARO LUIZ ZAMENHOF nasceu em 15 de dezembro de 1859, na cidade de Bialystok, na Polônia, então anexada ao Império Russo. Era filho de Rosália e Marcos Zamenhof, criterioso professor de geografia e línguas modernas.
Bialystok era uma pequena cidade que se constituía num palco de dolorosas lutas raciais, agravadas pela incompreensão lingüística entre os seus habitantes. A Polônia pertencia ao Império Moscovita, onde se falava cerca de duzentas (200) línguas diferentes. Só na pequena Bialystok falavam-se quatro (04) línguas oficiais: o Russo, o Alemão, o Polonês e o Ídiche.
Eram quatro nacionalidades distintas que tinham objetivos antagônicos, com línguas diferentes e crenças hostis umas às outras.
O menino Lázaro, com apenas 06 anos de idade, já se constrangia e se indagava ao assistir a discussões e contendas que terminavam em lágrimas, sangue e até mesmo em mortes violentas. Essa impressão terrível não mais se apagaria de sua mente.
Desde menino era prudente, modesto, pensativo e estudioso e em sua mente de gênio já se apresentava a idéia de elaboração de uma única língua neutra internacional. Na escola mostrava talento e cultura invulgares para escrever e era admirado pelos professores e amigos. Possuía uma conduta tranqüila e maneiras gentis. Nunca se mostrava superior a quem quer que fosse, nem em casa nem na escola.
Na 5ª série primária começou a estudar o inglês e ainda muito jovem estudou o francês e o alemão. Iniciando o curso ginasial, passou a estudar fervorosamente as línguas latina e grega, examinando a possibilidade de uma delas se constituir em língua internacional. Todavia, até a língua latina era difícil e cheia de antigas e inúteis formas. Mais simples, mais conveniente para o uso atual deveria ser uma língua sonhada. Ela deveria ser de aprendizagem rápida e acessível também ao povo e não apenas aos letrados. O fundamento da língua sonhada deveria ser a simplicidade e a lógica.
Nesse ínterim, a família transferiu-se para Varsóvia. Quando cursava a última série ginasial, já havia concluído o seu projeto sobre a Língua Universal. No dia 05 de dezembro de 1878, ele e um grupo de 6 ou 7 colegas do ginásio festejaram, ao redor de um bolo preparado carinhosamente por sua mãe, o nascimento da Língua Internacional. Na verdade, o projeto naquele dia comemorado era apenas uma forma embrionária do que mais tarde seria o ESPERANTO.
Terminado o ginásio, foi mandado para Moscou, onde iria estudar Medicina. Antes, porém, o jovem ZAMENHOF teve de prometer ao pai que abandonaria a idéia da língua universal, pelo menos provisoriamente, até terminar o curso de Medicina, e teve de entregar-lhe, naquele dia, os cadernos que continham os originais.
Seus pais não puderam mantê-lo em Moscou e fizeram-no regressar a Varsóvia. Contava então 22 anos de idade. Durante o seu afastamento, seu pai, “prudente e rigoroso”, por amor ao seu filho, temendo por seu futuro, queimou todos os manuscritos sobre a Língua Internacional.
Tão logo voltou à casa paterna, procurou por seus manuscritos e, não os encontrando, perguntou à mãe por eles. A resposta materna foram apenas lágrimas e silêncio. Lázaro Luiz adivinhou tudo. Procurou o pai e pediu-lhe para desfazer a promessa, pois queria dar continuidade ao seu grandioso trabalho. Tinha guardado na memória tudo o que continham os originais queimados. Fervorosamente refez tudo.
Só depois de experimentos exaustivos e comprovações minuciosas com os estudos da gramática e vocabulário intensamente vividos e testados foi que considerou pronta a sua obra. Estava nessa época com 28 anos de idade.
Mas restava um último detalhe: como publicá-la, sendo sua situação financeira bastante precária? De onde viriam os recursos? Um auxílio surgiu de onde ele menos esperava. Seu futuro sogro, homem afeito à cultura, financiou totalmente a publicação da obra, e, a 26 de julho de 1887 saía da oficina gráfica o seu primeiro livro.
Era uma gramática com as instruções em russo e chamava-se “LINGVO INTERNACIA”, de autoria de “DOKTORO ESPERANTO”. Esse pseudônimo, que na nova língua significa “DOUTOR QUE TEM ESPERANÇA”, com o decorrer do tempo, passou a ser usado por seus aprendizes, para denominar a própria língua: ESPERANTO. Pouco tempo depois eram lançadas as edições em polonês, francês, alemão, etc. Nesta ocasião Zamenhof teve que adotar outro pseudônimo, e optou pelo de “Unuel”, o que revela a sua grande humildade. UNUEL é composto pelas palavras unu (um) e el (entre), pois Zamenhof considerava-se apenas um dentre os demais esperantistas, não aceitando que o chamassem de Mestre.
Sem deixar a profissão, já médico formado, ZAMENHOF trabalhou ardorosamente na divulgação da Língua Internacional. Tamanha importância deu à propagação de seu ideal que, só depois de concluída e editada sua obra, veio a casar-se com CLARA SILBERNIK, com quem teve 6 filhos.
As pessoas que aderiram à língua neutra ficaram encantados com a força unificadora do ESPERANTO, e renderam-se à autoridade irresistível do grande missionário ZAMENHOF, cujos talentos de pensador profundo, intelectual vigoroso, artista inspirado e condutor nato sustentaram a causa com tal genialidade que nenhuma força, interna ou externa, pôde jamais destruí-la.
Toda a vida do DOUTOR ESPERANTO foi tecida de sacrifícios, abnegação e devotamento. Espírito verdadeiramente superior, era extremamente humanitário e solidário, cultivava a tolerância e era afável com todos, nunca perdendo uma oportunidade de ser caridoso. No exercício de sua profissão agia sob o impulso do desprendimento, não obstante haver permanecido sempre pobre. Dos camponeses jamais exigia honorários, chegando mesmo a dar-lhes dinheiro e a pedir a fazendeiros ricos auxílio para o socorro de sua clientela sem recurso.
Certa ocasião, após atender a crianças gravemente feridas num incêndio, inteirou-se de que o fogo havia destruído a propriedade de seus pais, reduzindo-os a absoluta miséria. ZAMENHOF deu-lhes todo o dinheiro que possuía, sem se preocupar em reservar algum para o regresso ao lar em longa viagem. Recorre para esse fim a um rico cliente das redondezas, para que lhe empreste o necessário para o seu regresso.
Um outro dia, no caminho que habitualmente percorre, encontra um carroceiro em prantos pela morte do seu cavalo, esgotado pelos esforços numa estrada coberta de lama. ZAMENHOF oferece-lhe 50 rublos para que o pobre homem tenha com o que comprar outro animal e assim assegurar o seu sustento.
De certa feita, após assistir uma agonizante idosa, juntamente com 4 outros colegas, recusa-se a receber da família polpudos honorários, considerando que a doença culminou com a morte da paciente. ZAMENHOF sempre se dedicou a seus clientes pobres, proporcionando-lhes até o fim de sua carreira dois dias da semana para consultas gratuitas, pedindo ao seu filho ADAM, igualmente médico, que continuasse essa prática.
Nos mínimos gestos e atitudes revelava-se a nobreza de seu caráter. Em Boulogne-sur-mer, França, por ocasião do 1º Congresso Universal de Esperanto, comparece, embora judeu, a uma missa do culto romano. A uma fervorosa Esperantista que lhe pede um autógrafo no recinto da Igreja ZAMENHOF sussurra: “Com muito prazer, minha senhora, mas eu lhe peço que seja em outro lugar - aqui é um lugar sagrado”.
Os pequeninos, os sofredores e particularmente aqueles que atravessaram a prova da cegueira, dedicavam entranhada veneração pelo bondoso oftalmologista de Varsóvia, ramo da Medicina em que se especializou, e quando ZAMENHOF visita Cambridge, para os festejos do 3º Congresso Universal de ESPERANTO, encontra-se com muitos cegos esperantistas provenientes de outros países, todos alojados numa mansão às expensas de outro grande pioneiro esperantista, THEÓFILE CART. Zamenhof cumprimentou cada um à parte, encorajou-os ao otimismo e de todos recebeu ardorosos agradecimentos pelo idioma que lhes proporcionava uma pequena claridade em seu mundo sem luz. Mas os cegos lhe pediram outro privilégio: queriam tocá-lo com as mãos, conhecer melhor aquele que nunca poderiam ver.
E suas mãos que, de forma tão extraordinária, traduzem pensamentos e emoções, tocavam respeitosamente o corpo pequeno e frágil, a barba, os óculos de lentes ovais, a larga calva do genial missionário polonês. Naquele momento, Zamenhof, profundamente emocionado, pensava nas crianças judias cujos olhos foram vazados durante um “progrom” na sua cidade natal de Bialystok.
Traído por um companheiro de ideal esperantista, em quem depositava absoluta confiança, ZAMENHOF deu profundo exemplo de tolerância e amor cristão, chegando a ser criticado por outros adeptos por ter feito longa viagem ao encontro do seu ex-amigo, o traidor, só para perdoá-lo.
Um dos grandes ideais de Zamenhof era dar aos religiosos de todas as correntes um fundamento neutro concreto para que se aproximassem em nome do Bem da Humanidade. Seu desejo era que todos os livros sagrados de todas as religiões fossem vertidos para o ESPERANTO. Ele próprio traduziu o Velho Testamento. Dizia que: “Se todos os fundadores de religiões pudessem encontrar-se pessoalmente, eles se apertariam as mãos reciprocamente, como amigos, porque todos tiveram um único objetivo: fazer com que os homens se tornassem bons e felizes”.
O ideal Esperantista fê-lo pairar acima de sua própria identidade nacional e racial. Quando o convidaram para a festa de fundação da sociedade judaica internacional em Paris, respondeu: “Estou profundamente convencido de que todo nacionalismo representa tão-somente um grande prejuízo para a Humanidade, sendo de opinião de que o objetivo principal de todas as criaturas deveria ser a criação de uma Humanidade harmônica. É certo que o nacionalismo dos oprimidos - como reação natural de autodefesa - é muito mais desculpável do que o nacionalismo dos opressores. Mas, se o nacionalismo dos fortes é vil, o nacionalismo dos fracos é imprudentes, ambos se engendram e se sustentam reciprocamente, dando lugar a um círculo vicioso de infelicidades, do qual a Humanidade jamais sairá se cada um de nós, fazendo o sacrifício de seu amor-próprio grupal, não tentar o encontro num terreno absolutamente neutro. Eis porque, apesar dos pungentes sofrimentos de minha raça, não quero aderir a um nacionalismo judeu, preferindo trabalhar apenas para uma absoluta justiça entre os homens. Estou profundamente convencido de que assim proporciono a meus irmãos maior soma de bem do que se aderisse a um movimento nacionalista”.
Mas, a mais expressiva homenagem, por nascer do coração de uma alma simples, foi a que lhe fez a velha criada da família Zamenhof. Ela era católica romana, mas durante toda a sua vida guardou em seu quarto, sob um crucifixo, uma fotografia de ZAMENHOF. Aos visitantes ela costumava mostrar esse retrato, dizendo: “Ele nunca pecou!”
O nobre espírito de LÁZARO LUIZ ZAMENHOF legou à família humana o instrumento ideal para a comunicação entre seus membros, engolfados numa consternadora multiplicidade de línguas e dialetos a entravar-lhes a marcha do progresso.
Em outubro de 1889 apareceu a primeira lista de endereços, com 1000 nomes de pessoas de diversos países, simpatizantes do ESPERANTO. Foram fundados clubes, mensários e revistas dando força a um movimento internacional que veio crescendo, pouco a pouco, sem interrupção.
Em 1905, já acontecia na França, na cidade de Bolonha do Mar, o 1º Congresso Mundial de ESPERANTO, onde se reuniram centenas de pessoas de vários países, comunicando-se em uma única língua.
Em 1910, foi realizado o VI CONGRESSO UNIVERSAL DE ESPERANTO, em Washington, Estados Unidos da América e o BRASIL nele se fez representar pelo Prof. JOÃO BATISTA DE MELO SOUZA, com apenas 21 anos de idade, que fez ver ao Dr. Zamenhof que não existia em sua gramática a palavra saudade. Zamenhof achou muito interessante a idéia e tratou de incluí-la na língua internacional, que a incorporou com os vocábulos sopiro, sopirado, resopiro e sãudado (poético).
Em 1914 seria realizado o 10º Congresso, em Paris, mas tal não aconteceu devido à deflagração da Primeira Guerra Mundial. Já estavam inscritas 3.700 pessoas para esse Congresso, frustrado pela incompreensão dos homens.
Em 14 de abril de 1917, sempre desejando a Paz, faleceu ZAMENHOF, na cidade de Varsóvia. Afastava-se esse grande homem, definitivamente, do convívio de seus familiares para retornar às suas atividades em favor da Humanidade, agora sem o fardo físico, que lhe serviu durante 57 anos.
O seu corpo repousa no cemitério israelita de Varsóvia, juntamente com o de CLARA, o amor de toda a sua vida e sua incansável colaboradora. Hoje lá podemos encontrar flores ofertadas por esperantistas de todo o mundo.
ZAMENHOF foi um homem iluminado, de moral superior, dotado de extraordinária força de vontade na divulgação de seu ideal humanístico. Foi um verdadeiro universalista, pacifista e pensador que lutou contra toda espécie de sectarismo.
Todos os anos, no dia 15 de dezembro, realizam-se eventos esperantistas no mundo inteiro, para comemorar o aniversário do criador da LÍNGUA ESPERANTO.